08 novembro 2010

Chamada ou slogan?

Fotografia: Zero Hora, 21/06/2010
Com freqüência, tem me chamado a atenção a quantidade de marcas publicitárias presentes em fotografias jornalísticas. Não me refiro a episódios de merchandising, comuns nas coberturas esportivas, por exemplo. Mas, a marcas publicitárias singelamente presentes em cenários que compõe as notícias e que, por um provável descuido do fotógrafo ou despreocupação da editoria, acabam por fazer parte de um espaço que aparentemente não lhes pertence. Se estes casos já parecem estranhos, o que dizer então de situações em que além de estar presente na fotografia que ilustra a matéria, a marca publicitária “conversa” com o conteúdo jornalístico apresentado?
Em seu artigo A supressão das notícias importantes, Edward Alsworth Ross já refletia sobre uma imprensa tomada por anúncios, o que classificou como “comercialização da imprensa”. Ainda hoje, podemos perceber esta invasão da publicidade aos meios impressos, que muitas vezes ocorre de forma híbrida, quando as marcas, por exemplo, se travestem de características próprias do veículo jornalístico. Uma situação de hibridismo tal, que o leitor não consegue mais discernir o que é notícia do que é propaganda. Este hibridismo contrasta com uma das preocupações de Ross, ao alertar que “a difusão das notícias e da publicidade são duas funções essencialmente diferentes que, por razões de conveniência, são realizadas pela mesma organização”.
No exemplo abaixo, capa da Zero Hora do dia 21/06/2010, há uma clara relação entre a chamada “Brasil Decola”, com a marca da companhia aérea Fly Emirates, presente ao fundo da cena na fotografia. Um “conversa” evidente e intencional entre a chamada e a marca publicitária. No entanto, extremamente singela. Ao utilizar-se de técnicas próprias da publicidade, misturando-as à linguagem jornalística, o editor responsável pelo conteúdo afinal produziu uma capa de jornal ou um anúncio publicitário?
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(Autor: Robert Thieme)

06 novembro 2010

Ética na TV: participação do cidadão na crítica da programação televisiva


Se a mídia vai mal, a sociedade deve ter mecanismos para intervir. Isso pode ser feito através de meios que possam “incitar” a mídia a cumprir bem o seu papel. No Brasil, ainda são raras as iniciativas que, sem a intervenção governamental, conseguem pressionar e dar voz ao cidadão na crítica à qualidade da programação dos meios de comunicação de massa. Um dos exemplos é a campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, lançada em 2002 pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e organizações da sociedade civil.
A campanha pode ser considerada como um Sistema de Responsabilização da Mídia (Media Accountability Systems – MAS), proposto por Claude-Jean Bertrand (2002). Ou seja, “um sistema que pode promover mecanismos de controle de qualidade, educação contínua e a devolução aos cidadãos os direitos humanos que os medias costumeiramente confiscam”. Os MAS discutem a viabilidade e importância de um controle social midiático que amplifique a crítica da sociedade com relação, por exemplo, à qualidade dos meios de comunicação de massa.
“Quem financia...” promove o acompanhamento permanente da programação da televisão para indicar programas que – de forma sistemática – desrespeitam convenções internacionais assinadas pelo Brasil, princípios constitucionais e legislação em vigor que protegem os direitos humanos e a cidadania. O “ranking da baixaria” é listado no site da campanha (http://www.eticanatv.org.br/), e os excessos indicados por denúncias são encaminhados ao Ministério Público. É uma iniciativa importante, mas de resultados que ainda esperam ser ampliados.
A problemática da regulação da função social da mídia não pode ser resumida ao modelo simplista de “mude o canal se não estiver satisfeito” como única forma de protestar contra a tendenciosidade da programação televisiva. É imperativo criar mecanismos que tornem os meios de comunicação mais responsivos ao que deles se exige legalmente. Iniciativas a partir de uma vigilância social sobre os meios de comunicação podem tornar a mídia mais sensível à sua função social e política. Serviriam também para o fortalecimento de uma cultura de participação democrática do cidadão na organização da programação televisiva.

(Autor: Luis Fernando Assunção)

04 novembro 2010

A crítica da cobertura das eleições no OI: um espaço democrático?


O site Observatório da Imprensa (OI) é um espaço de discussão e militância sobre as boas práticas jornalísticas. É evidente que esse veículo de crítica midiática representa um avanço para a sociedade. É exatamente o caráter interativo que pode contribuir para uma participação mais eficaz do seu público no debate sobre o que a mídia produz. Porém, quando se trata de assuntos acerca da cobertura das eleições 2010, surge a dúvida: O OI se constitui em um espaço democrático e seguro de formação de opinião pública?
Considerando que o ato de criticar é relativo e autônomo, por ser o julgamento do mérito pertencente à ordem da liberdade de espírito, a ideia exposta e compartilhada pelos articulistas tem inúmeras possibilidades e probabilidades de produção de sentidos. Por esse motivo, é importante a consideração de outros fatores contextuais aos artigos publicados. A intenção aqui é analisar e clarificar os conceitos básicos que norteiam o trabalho desenvolvido por articulistas do OI no que se refere à cobertura jornalística sobre as eleições presidenciáveis. O eixo condutor dessa reflexão está baseado na ideia de que a crítica não pode apresentar uma avaliação puramente subjetiva, mas também, deve oferecer uma descrição de aspectos objetivos concretos que deem sustentação aos argumentos.
Nessa perspectiva, os artigos apresentados até o momento no OI são exercícios intelectuais e lógicos que se opõem ao tratamento dado pela grande mídia. Como exemplo, no artigo do dia 7 de setembro de 2010, “O jornalismo de simulacros”, assinado pelo jornalista Washington Araújo, explicita-se uma revolta sobre a abordagem do caso da violação do sigilo fiscal de cinco personalidades ligadas ao PSDB, sendo que a estrela-vítima é Verônica Serra, filha do candidato à presidência, José Serra. A posição de repúdio desenvolvida no texto contempla a contextualização da experiência ideológica do jornalista que também é colunista do Portal esquerdista, Carta Maior.
Para Washington Araújo, a construção das notícias se faz no âmbito do denuncismo, sem apurações mais contundentes. Além disso, ele diz que os espaços nobres dos grandes jornais impressos, revistas e portais do país se transformaram em editoriais com declarações explícitas da posição contrária à candidata do PT, Dilma Rousseff. O articulista argumenta que esses veículos jornalísticos já se apoderaram da suposta verdade, proferindo sentenças finais em suas redações/tribunais. A condenação pela imprensa está vinculada à noção de poder discursivo, uma qualidade vicária do jornalismo.
O que se constata nas críticas do OI sobre a cobertura das eleições são denúncias alarmantes do abuso do direito à liberdade de expressão das empresas jornalísticas, do desalinhamento explícito da imprensa brasileira com a campanha política de Dilma Rousseff, ou do engajamento da grande mídia na oposição à candidata. Os artigos geram inúmeros comentários de internautas das mais variadas áreas de atuação. A maioria deles contempla a opinião dos articulistas. Em contrapartida, há os que discordam e não medem palavras para explicitarem suas opiniões.
A estrutura observada é porosa, porque apesar dos argumentos serem coerentes e comprovados, essas denúncias se constroem basicamente pela posição político-partidária dos críticos e, principalmente, pela postura da nova crítica, defendida por Ciro Marcondes Filho, de assumir oposições e paradoxos para conviverem em um mesmo território. É justamente esse espaço múltiplo que possibilita afirmar que no OI há abertura para a diversidade interativa e para a expansão de horizontes. Conforme José Luiz Braga, essa possibilidade de interação em um ambiente diferido e difuso gera processos interpretativos que estão além do que a mídia produz, e sim nas respostas das práticas sociais, a partir do que a sociedade apresenta. Sendo que, as ações dos articulistas e comentaristas podem se misturar e se interferirem mutuamente, caracterizando-se em contrapropositivas, interpretativas, proativas, corretoras de percurso, controladoras, seletivas, polemizadoras, laudatórias, de estímulo, de ensino, de alerta, de divulgação, venda, etc.
Com isso, pode se dizer que o espaço de crítica no OI é democrático, pois apesar da crítica especializada ser, em unanimidade, contrária à cobertura da grande mídia sobre as eleições presidenciáveis, está aberta para todas as formas de comentários, inclusive os mais ríspidos e desrespeitosos. É bem provável que exista alguma moderação de participação do internauta, mas é seguro afirmar que esse espaço exerce a competência de tensionar múltiplos processos interpretativos, gerar dinâmicas de participação e, por consequência, fornecer esclarecimento e percepção ampliada para o seu público.


(Autor: Adriana Garcia)