28 outubro 2010

Nossa reunião de novembro

A reunião de novembro do GPJor será no dia 25 de novembro, das 17 às 19h. Os profs. Christa Berger, Ronaldo Henn e Beatriz Marocco estarão apresentando e colocando em debate, no âmbito do grupo, os resultados parciais de seus projetos de pesquisa.

Lobos no galinheiro

É mais fácil mudar o curso do Rio São Francisco, do que transformar o direito de expressão de um punhado de empresas de comunicação, numa conquista da sociedade como um todo. Assim o jornalista e professor da UNB, Washington Araújo sintetiza seu pensamento, com o qual me identifico, sobre a proposta de autorregulamentação da mídia, da Associação Nacional de Jornais.
Como o lobo cuidando do galinheiro, a entidade que em sua própria composição abriga oligopólios e monopólios, num desrespeito à Constituição, defende que ela mesma determine os limites entre a liberdade de imprensa e o direito à informação do cidadão brasileiro.
Deve haver controle sobre a mídia, nem seus barões discordam disso. Necessitam deste signo para acompanhar a onda democratizante nascente via internet. Segundo Alberto Dines, o mercado exige. Apesar da presidente da ANJ afirmar que democracias de verdade não precisam de lei de Imprensa, e evocar fora de contexto, a idéia de Cláudio Abramo: “a ética do jornalista é a ética do cidadão”.
Democracia, no entanto, pressupõe opinião de todos, como ocorre com a educação, saúde ou com o exercício da Medicina. Manifesto em Projeto de Lei da Federação Nacional dos Jornalistas, encaminhado ao Congresso, o controle social sobre a imprensa foi rechaçado pelo patronato sob a alegação de que "setores autoritários do bloco hoje dominante na política brasileira, o de Lula e Dilma, acenam com um controle `social´ sobre a mídia. Mas como formar um conselho representativo? Como evitar que esse conselho seja dominado pela militância em nome da `sociedade´? Como assegurar que suas decisões sejam`certas´?".
Justifiquemos, pois, puxando a brasa para o nosso lado, jornalistas e cidadãos: Porque os donos dos jornais querem legislar em causa própria? Quem na autoregulamentação vai representar o povo brasileiro?
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(Autor: Maria Luiza Santos Soares)

26 outubro 2010

Os Cowboys do Meio-Oeste: O radiojornalismo interiorano e suas práticas comerciais

No ano de 1910, Edward Ross, um dos pioneiros da sociologia norte-americana, publica na revista Atlantic Monthly um artigo que se tornou referência nos estudos em jornalismo. O artigo “A supressão das notícias importantes” nos apresenta um diagnóstico precoce das transformações pelas quais os jornais da época estavam passando, demonstrando a divisão entre propriedade e comando editorial, um afastamento dos princípios positivistas do jornalismo como defensor da democracia e uma gradual profissionalização da área. Ross identifica uma prática de mercantilização das notícias onde determinados acontecimentos sobre alguns grupos que financiavam os jornais simplesmente eram suprimidos dos periódicos, a fim de preservar a imagem e os lucros destas empresas, Ross destaca que essas empresas eram chamadas nas redações de as “vacas sagradas”.

Hoje, percebemos que não só as práticas mercantis usadas pelos jornais na época de Ross ainda continuam em vigor, como se aperfeiçoaram de modo a ter o jornalismo não como fonte de informação, mas sim, como forma de lucrar cada vez mais com a notícia, seja publicando ou suprimindo-as. Um exemplo claro dessas práticas ocorre frequentemente no radiojornalismo interiorano. Considerado como fonte primária de informações locais por grande parte da população que reside em cidades pequenas do interior, o radiojornalismo exerce sua influência não em prol de uma pluralidade de informações e de uma postura ética em relação ao seu público. Algumas rádios do interior se especializaram em caçar e laçar as “vacas sagradas” apontadas por Ross. Sendo característica das pequenas cidades interioranas uma infraestrutura econômica simples se torna mais fácil identificar quais são essas “vacas sagradas”, o exemplo que segue é o que melhor caracteriza essa forma de caça do radiojornalismo.

Uma das principais “vacas sagradas” do radiojornalismo de interior são as agroindústrias, por várias vezes a população ribeirinha de uma cidade do meio-oeste de Santa Catarina denunciou à rádio local o vazamento de dejetos no rio que corta a cidade, sabendo que esta agroindústria é uma multinacional e não pode enfrentar problemas com relação ao meio ambiente devido à forte campanha publicitária que faz em nome da sustentabilidade, o departamento de jornalismo da rádio prepara uma ótima matéria sobre o acontecimento, com relatos dos moradores e de algumas fontes oficiais, entretanto, a matéria não vai ao ar como seria o esperado, ela vai para as mãos do pessoal do departamento comercial, que não demora em entrar em contato com a diretoria da empresa, mostrar a matéria, assinar o contrato de publicidade para emissora e arquivar a matéria.

Essa prática nos revela o verdadeiro espírito “cowboy” dos jornalistas radiofônicos do meio-oeste, mas não os cowboys heróicos apresentados pelos faroestes holywoodianos, mas sim os “cowboys” históricos que foram responsáveis pelas chacinas indígenas no oeste norte-americano e pelos roubos, saques e assassinatos de pequenos colonos que pensavam em fincar raízes e construir um lar naquela região, entretanto, os nossos “cowboys” chacinam a ética profissional do jornalismo e saqueiam o direito à informação da população que sequer tem conhecimento que está sendo lesada.

(Autor: Marlon Sandro Lesnieski)

Jogo de visibilidade e invisibilidade

Sebastião Salgado
Fazenda Giacometti, Paraná, 1996.
Colocar em discussão o que no interior das fotografias nos leva para fora do quadro imagético. Falar do jogo de visibilidade e invisibilidade no qual a possibilidade de “entrar e sair” é que torna latentes suas tensões. Essa poderia ser, talvez, a verdadeira vocação da crítica (ou da pesquisa) sobre fotografias: discutir a carga informativa que transborda do enquadramento e faz da imagem construída pelo fotógrafo muito menos indício do acontecimento e muito mais resultado de seus atravessamentos externos.
A marcha do MST cruzando as porteiras de uma fazenda no Paraná eternizada por Sebastião Salgado já, num primeiro momento, nos joga para fora do quadro. A neblina e o homem com a foice em punho conferem certo ar épico à cena. Ambos elementos remetem ao cinema e, mais especificamente a filmes como “Coração Valente” (1995). Porém, como um Mel Gibson às avessas, o que o nosso olhar encontra na foto de Salgado é um camponês cabisbaixo frente ao seu “exército” disperso. 
O sociólogo José de Souza Martins [1] investiu sua crítica ao que considera o punctum da foto: o camponês com a foice na mão. No entanto, segundo Martins, o “enfraquecimento” da imagem não se deve ao fato do agricultor estar olhando para baixo, mas por Sebastião Salgado focá-lo a partir de dentro da fazenda. Assim, “ao atravessar a porteira, antes dos sem-terra, Salgado transfigurou completamente, com seu ato e sua fotografia, o acontecimento e a epopéia. (...) ao fazer isso, privou o ato de sua dimensão ritual, destituiu a liturgia da conquista de sua dimensão épica, dando-lhe a conotação de simulação do épico”[2].
Neste sentido, o próprio autor afirma que a sua fotografia, como qualquer outra, é uma forma de intervenção direta no que está sendo fotografado. “Quando fotografo, eu o faço com meu subconsciente, com a minha ideologia, entendida como o conjunto das minhas idéias, e é claro que a fotografia é inteiramente conduzida. Disso eu tenho consciência absoluta"[3]. Portanto, a crítica não se volta à plasticidade desse acontecimento. Mas às práticas do fotógrafo. Salgado é um fotógrafo extremamente consciente de sua busca pela beleza mesmo nas situações mais adversas, como na luta pela terra. E o impacto de suas obras se deve muito a esta qualidade estética.

O que faz essa fotografia, em específico, perder parte de sua força, não está na forma, mas no conteúdo ideológico que se dá a ver. É justamente a escolha do enquadramento que nos joga para fora da imagem. Ao escolher este ponto-de-vista, o fotógrafo faz saltar aos olhos dos espectadores o que está na ordem do invisível. Sebastião Salgado, enfim, se posiciona sobre o movimento sem-terra: invasões mediáticas, premeditadas pela objetiva.



[1] MARTINS, José de Souza. Sebastião Salgado: a epifania dos pobres da terra. IN: MAMMÌ, Lorenzo; SCHWARCZ, Lilia Moritz (ORG). 8 x fotografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 133-171.
[2] Idem, p. 142
[3] “Cultura: Entrevista com Sebastião Salgado - Caçador de luz” - Entrevista com o fotógrafo Sebastião Salgado realizada pelo historiador e assessor da Secretaria Agrária Nacional do Partido dos Trabalhadores no ano de 1999, Rogério Sottili, publicada no site da Fundação Perceu Abramo em 17/04/2006. Disponível em: http://www.fpabramo.org.br/o-que-fazemos/editora/teoria-e-debate/edicoes-anteriores/cultura-entrevista-com-sebastiao-salgado-ca.

(Autor: Júlia Capovilla)

21 outubro 2010

“Creo en el periodismo"

“Creo en el periodismo. Da igual publicar en papel o en Internet”. A afirmação é do jornalista Ramón Lobo, do El País, que na terça, 19, participou da conferência “Explicar a guerra em tempos de internet”, realizada na Caixa Fórum de Barcelona. Correspondente em guerras ou conflitos no Iraque, Bósnia-Herzegovina, Croácia, Servia, Kosovo, Haiti, Afeganistão, Líbano, Israel e Palestina, Filipinas, Quênia, Ruanda, Congo, Guinea Equatorial, Guinea Conakry, Etiópia, Serra Leoa, Uganda, Nigéria, Zimbábue, Namíbia, Libéria, Nigel, Moçambique, África do Sul, Suazilândia, Somália, o jornalista falou da relação entre jornalismo e internet no âmbito das coberturas internacionais, refletindo sobre estas.
Para Lobo, a internet oferece vantagens para correspondentes e enviados especiais, especialmente, por simplificar os processos de transmissão, o que lhes possibilita “más tiempo para ir por la calle”. Se de um lado, segundo o correspondente, a internet auxilia na busca por informações – já não preciso viajar com um caderno com a relação das autoridades de determinado lugar, disse; por outro, não significa que as informações ali disponíveis sejam de melhor qualidade.
Quanto à experiência como correspondente de guerra, Lobo afirma se sentir fracassado como jornalista. “Não alteramos nada”, afirma. “Bósnia e Servia se repetem agora em outros lugares”, acrescenta. “A guerra em Sarajevo foi um grande fracasso coletivo de jornalistas; quatro anos lá e não pudemos mudar nada”, conclui. Muito de sua experiência está em livros como O herói inexistente, publicado em 1999, ou no recém-lançado Cadernos de Cabul. O jornalista participou também de duas obras coletivas: Os olhos da guerra, de 2001, e Seguiremos informando, também de 2010.
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Crise na indústria informativa
Outro tema explorado por Ramón Lobo é a atual crise na imprensa. O jornalista estabeleceu diferenças entre a crise no setor de jornais e no jornalismo. Em relação à gestão dos jornais pairam incertezas quanto ao jornalismo na web, suas formas de financiamento e uso. Rámon Lobo recorda que os jornais que tentaram cobrar pelo acesso as suas versões digitais tiverem um decréscimo no número de leitores e viram-se forçados a voltar atrás nesta decisão.
Para Lobo, um dos principais problemas do jornalismo na atualidade é que ele se faz a partir de referências, um jornalismo de citações entre aspas, em abandono as histórias que existem por trás das pessoas. Ainda segundo Lobo, tampouco na Internet há espaço para este tipo de narrativa. Quanto à crise no jornalismo, diz que é preciso contar histórias distintas nas versões em papel e digital dos jornais e que a grande virada está em fazer um jornalismo atrativo, que desperte o interesse e que leva a audiência a desejar comprá-lo.
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Angela Zamin, de Barcelona

17 outubro 2010

Os mineiros e a esclerosidade midiática

 
Foto reproduzida de Veja, out. 2010
O cinema transforma fatos do presente e do passado em narrativas audiovisuais. Obviamente, o transporte dessas histórias às telas impõe uma série de técnicas, desde a captação fragmentada das cenas até o resumo de complexidades para se ajustar em um período aproximado de duas horas. A “versão do diretor” justifica o recorte da história em detrimento de fatos considerados menos importantes, ou que não poderiam ser incluídos na trama em razão do já citado tempo de exibição. Talvez uma receita de Hollywood para não deixar esquentar os copos de refrigerantes dos espectadores.
Por vezes ocorre o inverso e fatos reais se aproximam muito de histórias que o cinema já contou. O último caso, e que estrela no agendamento da imprensa mundial, é o resgate dos 33 trabalhadores soterrados em uma mina no deserto do Chile por quase 70 dias. O diretor Billy Wilder contou, em 1951, a história de Charles Tatum, um jornalista “marrom” que se aproveita de um acidente em uma mina localizada no interior dos Estados Unidos e transforma o fato em um verdadeiro espetáculo, mas com um final trágico. O nome da trama nos Estados Unidos teve um nome sugestivo: “Big Carnival”.
Certamente não esperávamos atravessamentos e consequências da manada midiática no caso do Chile como no cinema de Wilder, mas o que ocorre agora com a história dos mineiros presos contada pela imprensa parece ser a mesma que determina um padrão para o cinema. Um padrão de mais romantizar o drama das pessoas presas 700 metros abaixo da superfície, do que contextualizar o fato com questões mais profundas, como por exemplo, agendar a discussão sobre a mineração, um dos mais degradantes trabalhos realizados pelo homem. Deslocamo-nos de um ponto a outro do planeta em horas, trocamos de tudo por meio de fibras óticas e vivemos numa tal pós-modernidade. E, mesmo nessa “avançada” fase da humanidade, precisamos ainda de pessoas trabalhando embaixo da terra. Mas em quais condições? Essa fatalidade não foi a primeira, não será a última e a imprensa não retoma diversos outros casos tão trágicos como o que ocorreu no Chile.
Existe um termo na imprensa, cunhado por Edward Ross, que define a proteção às atividades capitalistas, instituições governamentais ou personalidades intocáveis, as chamadas “vacas sagradas”. Ao que parece, a mineração é uma dessas vacas. Diferente da indústria tabagista, de plástico e de petróleo, ela ainda não foi agendada. Cabe saber da imprensa o motivo. Se o cinema, às vezes, elimina o complexo para fazer caber em seu padrão audiovisual, a imprensa faz o mesmo com questões humanas para apenas tapar sua grade de programação, mas esquece que poderia fazer diferente e atuar como agente mobilizador. Jornalistas ainda se amparam em uma tal objetividade para apenas narras fatos e, o pior de tudo, incompletos. Como já citou a pesquisadora Mar de Fontcuberta, falta o contexto e sobra o jornalismo mosaico, um sintoma que só poderíamos definir como a esclerosidade midiática, quando parece faltar memória na imprensa. Afinal, é preferível pensar assim a acreditar que o jornalismo ainda proteja interesses financeiros de grandes grupos focados no extrativismo a qualquer custo.
No entanto, aplaudimos nossa atividade em saber que um dos mineiros presos viu sua filha recém nascida por meio de uma tela. Ou que permitimos ao mundo acompanhar o resgate desses trabalhadores. Parece ser apenas esse nosso consolo como jornalistas. Um dos mineiros resgatados, Mario Sepúlveda, já deu o recado: “não nos trate como artistas. Somos mineiros.”.
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(Autor: Giovanni Rocha)

Próxima reunião do GPJor

A próxima reunião do Grupo de Pesquisa em Jornalismo será no dia 20/10, quarta-feira, às 17 horas, no PPGCOM. Durante o encontro, os mestrandos Giovanni Rocha e Marlon Lesnieski apresentarão o tema “Estudo de Caso”, com base nos seguintes textos:

DUARTE, Márcia Yukiko Matssuchi. Estudo de caso. IN: DUARTE, Jorge; BARROS, Antonio (org.). Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.215-235.

GOLDENBERG, Mirian. Estudos de caso. IN:_____. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais. 2.ed. Rio de Janeiro: Record, 1998, p. 33-35.

GOLDENBERG, Mirian. O método biográfico em Ciências Sociais. IN:_____. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais. 2.ed. Rio de Janeiro: Record, 1998, p. 36-43.

A bibliografia indicada acima também deverá ser lida por todos participantes do encontro.

(Júlia Capovilla)